segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Reflexões acerca do tema: “O adolescente e a escola hoje”

A palestra do psicanalista José Outeiral, “O adolescente e a escola hoje”, dentro da XXXIII Jornada do CEAPIA, suscitou no grupo da Comunidade reflexões e questionamentos sobre vários aspectos relacionados ao papel do professor e da escola e ao adolescente e sua família nos dias de hoje.
O período da adolescência se estendeu: inicia precocemente e se prorroga bem além dos 20 anos. A invasão precoce da adolescência no período da infância acaba prejudicando a latência, o pensamento simbólico e o período escolar. Até pouco tempo atrás, o professor estava preparado para receber um aluno, na fase da latência, com condições de reprimir seus impulsos e canalizá-los para a prazerosa aprendizagem. No entanto, hoje encontra alunos que parecem já adolescentes, revelando um comportamento sexualizado e muitas vezes com dificuldades para aceitar limites e tolerar as frustrações inerentes a todo processo de aprendizagem e ao relacionar-se com os iguais. O que está influenciando este “novo” aluno é o que tentamos entender na atualidade.
Inúmeros aspectos podem ser citados como influências e até determinantes destes comportamentos. O psicanalista Ruggero Levy, em seu artigo “Desejo e prazer: a construção do sujeito pós-moderno”, fala que no atual contexto cultural vê-se a tecnologia criando novas ilusões, a intolerância à frustração imperando, o laço humano tornando-se como qualquer outro objeto de consumo, com seu caráter fugaz, e o incentivo a que a dor psíquica e o sofrimento mental sejam eliminados a qualquer preço. Tudo isto acarretaria  a substituição dos vínculos humanos pelos virtuais e a insuficiência nos processos simbólicos.
 Percebemos, na nossa cultura, a supervalorização do novo. Manter-se jovem a qualquer preço e adotar um comportamento adolescente, negando a inexorável passagem do tempo, parece eliminar a hierarquia das gerações e a autoridade necessária à estruturação de limites e da moralidade.
A psiquiatra Norma Escosteguy, referindo-se às novas configurações familiares da cultura pós-moderna, procura relacionar as mudanças nas famílias com as mudanças psíquicas observadas na atualidade. Cita fatores como o controle da natalidade, o menor número de filhos, o maior peso nas escolhas e expectativas, com projeções narcísicas importantes e exageradas, como importantes influências no psiquismo. As novas possibilidades de  reorganização das famílias trazem novas formas de educar e de modelos, com novas questões a serem pensadas e compreendidas.
Como, então, ensinar, educar e lidar com este adolescente de hoje? O que cabe ao professor e à escola na atualidade? Questionamentos sem respostas. No entanto, Dr, Outeiral nos trouxe três aspectos que considera importantes para nortear nossas ações: segundo ele, deve-se preservar o mundo adulto, manter sempre a utopia e não abdicar da autoridade perante as crianças e adolescentes.
O psicanalista Nazur Vasconcelos, ao abordar o exercício da autoridade na instituição educacional, destaca que cabe ao professor continuar exercendo a imposição de limites que lhe é concedida pelos pais ou que fora conquistada por ele na interação com os alunos. No entanto, há pais que tem dificuldades em exercer esse papel, por verem na gratificação do seu bebê/filho uma forma de gratificação própria. Há pais que pecam em não frustrar seus filhos, o que impede o movimento pendular entre onipotência e frustração e cristaliza a situação de “sua Majestade, o bebê”. Quando os pais falham na tarefa de impor limites, abrem caminho para relações de dominação narcísica, nas quais o outro é visto como fonte de gratificação. Entretanto, segundo Nazur, o professor sabe que, para aprender, o aluno deve renunciar ao livre brincar e encarar o não-saber, o que pode ser frustrante. Para ensinar, o professor deve poder exercer sua autoridade e dar continuidade ao trabalho que deveria ter iniciado na família, o de dizer “não” ao bebê/aluno.
A complexidade deste tema nos inquieta e motiva reflexões. A problemática do aluno de hoje só pode ser compreendida à luz do contexto em que vive, familiar e social. Entendemos que a crise na família hoje traz como consequência a indefinição quanto aos papéis de cada um, trazendo dificuldades na imposição de limites e no respeito a regras.
A escola atual parece não acompanhar o adolescente de hoje em suas mudanças e inquietudes. A velocidade nas mudanças tecnológicas e na aquisição do conhecimento parecem influenciar diretamente a atenção e o modo de aprender das crianças e adolescentes, que precisam conciliar inúmeras informações em curto espaço de tempo. Há um amplo leque de possibilidades de aprendizagem e estímulos oferecidos às crianças que, muitas vezes, ao invés de propiciar experiências e novos caminhos de descoberta, sobrecarregam-nas. Ao mesmo tempo em que hoje se tem um olhar mais direcionado às diferenças e individualidades, parece haver também uma expectativa maior de que as crianças e adolescentes sejam hábeis em tudo, para corresponder a um mundo competitivo e complexo.
Nos dias de hoje nos deparamos com crianças “experts” em manusear recursos eletrônicos, com suas telas coloridas, atraentes e repletas de estímulos.  Muitas vezes vê-se que as interações entre pais e filhos estão sendo mediadas por estes equipamentos, que trazem inúmeras informações, mas não propiciam a troca de emoções e vivências. O brincar criativo, desestruturado, que abre caminhos para a fantasia e a simbolização, necessária à construção de novas aprendizagens, passa a ser substituído pelo “clicar” e pelo imediato prazer, sem limites e frustrações. A brincadeira livre e imaginativa está cedendo lugar à aprendizagem formal cada vez mais cedo. Desde a mais tenra idade, por exemplo, percebe-se que pais e professores desejam que as crianças aprendam a ler e escrever antes mesmo de adquirirem habilidades motoras mais simples e básicas.
A família está se modificando, bem como a escola. Flexibilizar métodos de ensino, abrir espaços para o pensar e construir novas formas de integrar os conhecimentos, nos parece necessário. Cabe a pais e educadores acompanhar as novas exigências e possibilidades da vida moderna sem abdicar do papel de impor limites, representar autoridade e mostrar às nossas crianças e adolescentes o mundo real. A majestade do bebê deve dar lugar à criança comum, que necessita brincar e interagir com outro ser humano, com suas potencialidades, habilidades e inevitáveis limitações.

Setor da Comunidade 
Coord. Kátia Ludwig
Lenora Bellini
Adriana Ferreira

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